Apodi 360

"Entreguei a Deus": Mãe solo que sobrevive do lixão de Apodi desabafa sobre o futuro após fechamento

(Foto: Josemário Alves - Apodi 360)

Por trás do anúncio do fechamento oficial do lixão de Apodi, celebrado como um marco ambiental pelo poder público, há uma realidade dolorosa que começa a emergir e que até agora não recebeu a devida atenção: o drama dos catadores de materiais recicláveis que, por décadas, tiraram do lixo o sustento de suas famílias.

Lenice Nascimento, de 33 anos, é uma dessas vozes invisíveis. Em entrevista ao blog Apodi 360, ela contou, entre lágrimas, que não sabe o que fazer da vida com o fim do lixão.
 
Desde os cinco anos de idade, aprendeu a catar materiais reciclados ao lado dos pais. Hoje, mãe solo de três filhos pequenos, essa foi sua única fonte de renda por toda a vida. O que ganhava, cerca de um salário mínimo por mês, vinha da venda de papelão, plástico, latas e garrafas coletadas entre os montes de lixo. Agora, sem esse trabalho e sem qualquer perspectiva, Lenice se apega à única coisa que ainda tem: a fé. 

“Eu entreguei a Deus. Porque, sinceramente, não sei mais o que fazer. A gente já vivia com tão pouco, agora nem isso vai ter mais”, disse elas com os olhos marejados. 

(Foto: Josemário Alves - Apodi 360)

Lenice revelou que estava nos planos dela “fazer um bolinho” para a filha mais velha, que vai completar 15 anos no final desse mês, mas que vai ter que cancelar pra poder economizar.

Além da renda dos recicláveis, ela é beneficiária do Bolsa Família, o único valor fixo que vai entrar na sua casa a partir de agora. Segundo ela, esse valor mal cobre os custos básicos com comida e escola das crianças. 

Lenice não está sozinha. Outras seis pessoas, que também sobrevivem exclusivamente da coleta no lixão, enfrentam o mesmo dilema. Nenhuma delas, até agora, sabe como vai ser daqui pra frente.

(Foto: Josemário Alves - Apodi 360)

Promessas vagas e futuro indefinido 

Durante a cerimônia simbólica de encerramento do lixão, o prefeito Sabino Neto disse à imprensa que o município pretende sim incluir os catadores em alguma ação de apoio social, mas não apresentou detalhes.

“O Gabinete já se disponibilizou a entrar em contato. Eu vou tá em agenda na próxima semana, mas ao retornar, a gente vai sentar, por que aqui é um problema de saúde pública, é um problema ambiental, mas também é um problema social. E a gente tem a serenidade, vamos sentar com eles, encontrar uma solução para que a gente não deixe essas famílias na mão”, disse o prefeito.

O blog Apodi 360 entrou em contato com a chefia de Gabinete da Prefeitura para buscar esclarecimentos sobre possíveis políticas de amparo ou alternativas de trabalho para essas famílias. 

“O município já fez um convênio com o Sebrae e, através do Programa Nacional Pró-Catadores, dará o suporte, desde o cadastramento até a criação de uma associação para programa de coleta seletiva. Iremos fazer tudo o que for necessário para dar suporte a estas famílias”, respondeu o secretário Juniano Morais.

A ausência de um plano social claro contrasta com o investimento de até R$ 150 mil mensais que a Prefeitura fará para enviar o lixo ao aterro sanitário controlado. Apesar da importância ambiental do encerramento do lixão, a indefinição sobre o futuro das pessoas que dependiam dele revela um vazio de planejamento social que pode custar caro às famílias mais vulneráveis do município, principalmente a curto prazo.

O fechamento do lixão, ainda que necessário e legalmente obrigatório, não pode apagar a realidade de dezenas de vidas moldadas pelo trabalho invisível da reciclagem. Pessoas como Lenice não podem simplesmente ser descartadas junto com os resíduos.

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